03 nov Dr. Técio Lins e Silva: Uma Vida Dedicada à Defesa da Justiça e da Liberdade
No último dia 31 de outubro de 2025, o renomado advogado criminalista Dr. Técio Lins e Silva participou de uma entrevista exclusiva no canal Brasil 247, conduzida pela jornalista Denise Assis. Aos 80 anos e com 60 anos de uma carreira marcada por lutas emblemáticas, Dr. Técio compartilhou histórias de sua trajetória, reflexões sobre o sistema judiciário e críticas contundentes à violência estatal, com destaque para a operação policial no Rio de Janeiro que resultou em 134 mortes. A entrevista, disponível no YouTube, revela não apenas a expertise jurídica do advogado, mas também sua paixão pela defesa dos direitos humanos e sua visão crítica sobre os desafios enfrentados pelo Brasil.
Uma Linhagem de Advogados e a Herança da Resistência
Dr. Técio Lins e Silva carrega em seu DNA a vocação para a advocacia. Filho, neto e sobrinho de advogados, ele herdou, aos 22 anos, ainda estudante de Direito, a banca de seu pai, Raul Lins e Silva, falecido precocemente aos 54 anos devido a um erro médico. Esse início desafiador lançou Técio diretamente na defesa de presos políticos durante a ditadura militar (1964-1985), período em que a repressão estatal era feroz. Ele relembra com emoção sua estreia no Tribunal Militar, em 1968, quando, ainda não formado, defendeu um habeas corpus em homenagem ao pai, conquistando a absolvição unânime de seus clientes em um ambiente carregado de emoção e respeito.
A entrevista destaca a tradição familiar de compromisso com a justiça. Seu tio, Evandro Lins e Silva, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, renunciou ao cargo em solidariedade aos colegas cassados pela ditadura, um gesto que reflete os valores que moldaram a carreira de Técio. Durante duas décadas, ele defendeu centenas de presos políticos, incluindo figuras como Ziraldo e Luiz Tenório, enfrentando a repressão com coragem e habilidade jurídica.
A Luta Contra a Ditadura e o Exercício da Advocacia
Técio narrou episódios marcantes de sua atuação durante a ditadura. Ele destacou a dificuldade de atuar em um contexto de incomunicabilidade, em que os primeiros dez dias de prisão eram críticos, com risco de tortura ou desaparecimento. Junto a um pequeno grupo de advogados – cerca de dez no Rio de Janeiro –, ele centralizava processos de todo o Brasil, muitas vezes sem cobrar honorários, seguindo a tradição de nomes como Sobral Pinto. A estratégia de defesa era meticulosamente planejada, com advogados como Heleno Fragoso abrindo os julgamentos com teses jurídicas e Técio, frequentemente, encerrando com argumentos emocionais que apelavam à consciência dos juízes militares.
Um caso emblemático foi a defesa de um estudante de química acusado de participar de um assalto a banco que resultou em morte, crime que, à época, previa pena de morte ou prisão perpétua. Técio conseguiu reduzir a pena para prisão perpétua e, posteriormente, para 30 anos, com o cliente sendo libertado após cumprir poucos anos devido à anistia e à revisão das leis de segurança nacional. Histórias como essa ilustram a habilidade de Técio em navegar um sistema jurídico opressivo para garantir justiça aos seus clientes.
O Instituto Técio Lins e Silva: Preservando a Memória da Resistência
Um dos pontos altos da entrevista foi a apresentação do Instituto Técio Lins e Silva, que será inaugurado em 2026 no mesmo endereço onde funciona seu escritório desde 1964. O instituto abrigará um acervo centenário, com arquivos que documentam a resistência às ditaduras de Vargas (Estado Novo) e de 1964. Esse material, preservado por orientação de sua família, inclui processos do Tribunal de Segurança Nacional e registros de presos políticos, oferecendo uma memória viva da luta pela liberdade de pensamento e contra a violência estatal.
O objetivo do instituto é ser um centro de referência e memória, promovendo reflexões sobre justiça, direitos humanos e cidadania. Técio enfatizou a importância de dar um “fim didático” a esse acervo, incentivando as novas gerações a “pensarem grande” e aprenderem com as lições do passado.
Críticas à Operação Policial no Rio de Janeiro
Um dos momentos mais contundentes da entrevista foi a análise de Técio sobre a recente operação policial no Rio de Janeiro, que resultou em 134 mortes. Com a autoridade de quem presidiu o Conselho Federal de Entorpecentes na Nova República (1985), ele classificou a ação como uma “barbárie” sem precedentes, comparando-a às atrocidades da ditadura militar, mas destacando sua gravidade ainda maior. “Nem na ditadura se viu tamanha barbárie”, afirmou, criticando a incompetência do governo estadual e a conivência de setores da sociedade que aplaudem a violência.
Técio defendeu a descriminalização das drogas como uma solução para reduzir a violência associada ao tráfico. Ele relembrou sua atuação no Conselho de Entorpecentes, quando liderou a descriminalização do uso ritual do Santo Daime, em 1986, após um estudo detalhado no Acre. A decisão, apoiada pelo então ministro da Justiça Fernando Lyra, provou que a descriminalização não aumentou o abuso da substância, reforçando sua visão de que a proibição é a raiz de muitos problemas sociais.
Procurador-Geral de Niterói: Um Novo Desafio aos 80 Anos
Aos 80 anos, Técio assumiu, em janeiro de 2025, o cargo de Procurador-Geral de Niterói, onde atua como “advogado da cidade”, defendendo os interesses jurídicos da municipalidade. Ele destacou a competência da equipe de 40 procuradores concursados e a gestão inspiradora do prefeito Rodrigo Neves, que o convidou para o desafio. A experiência, segundo ele, tem sido gratificante, permitindo-lhe continuar contribuindo para a justiça em uma nova esfera.
Reflexões sobre a Justiça e a Ética
Questionado sobre o pedido de revisão criminal apresentado pela defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro, Técio optou por não comentar, citando o código de ética da advocacia, que proíbe opinar sobre causas de outros advogados. Contudo, expressou sua decepção com o comportamento de um ministro do Supremo, a quem ele próprio aprovou em um concurso para juiz, destacando a responsabilidade ética que marca sua trajetória.
Legado e Inspiração
A entrevista com Dr. Técio Lins e Silva é um mergulho na história do Brasil, contada por alguém que viveu e moldou momentos cruciais da luta pela democracia e pelos direitos humanos. Sua trajetória, marcada por coragem, ética e compromisso com a justiça, é um exemplo para as novas gerações de advogados e cidadãos. O Instituto Técio Lins e Silva promete ser um marco na preservação dessa memória, enquanto sua atuação como procurador demonstra que, mesmo aos 80 anos, ele continua sendo uma voz incansável na defesa da liberdade e da dignidade.
Assista à entrevista completa no canal Brasil 247 e conheça mais sobre a vida e o legado de um dos maiores advogados criminalistas do Brasil.